A primeira vez que ouvi falar no termo ecovila foi há quase três anos, em um evento promovido pela equipe da Pedagogia da Cooperação na Lagoa Rodrigo de Freitas no Rio de Janeiro, com a facilitação da Taisa Mattos (co-fundadora da ecovila de Terra Una/MG).
Lembro-me exatamente do brilho que a sua apresentação provocou em meus olhos. A minha sincronicidade com o tema foi imediata!
Segundo Taisa, “ecovilas são comunidades intencionais com foco no desenvolvimento local sustentável. São pessoas que decidem viver juntas em harmonia com o ambiente para criar um modelo de vida sustentável.
A sustentabilidade não é só ambiental como muitas das pessoas vêem. Hoje em dia, o nosso maior gargalo é a sustentabilidade social. Como que a gente nessa cultura atual, individualista e competitiva, consegue viver junto, se relacionar, cuidar dos conflitos e gerir um espaço em conjunto?
O tripé do desenvolvimento sustentável é pensar no social, no ecológico e no econômico, e as ecovilas colocaram um ingrediente a mais que é o aspecto cultural. É um projeto de grupo cujo centro é a vida em comunidade”.
Dois anos depois de ter ouvido este discurso da Taisa, lá estava eu em Brasília celebrando os 10 anos do Programa Gaia Education no Brasil e me conectando com diversas ecovilas e com a nossa mãe ganso May East – que me apresentou o GEN Global Ecovillage Network. Também tive a oportunidade de reencontrar a Taisa e conhecer a iluminada equipe de Terra Una, onde cursei a dimensão social do Gaia Education no último Carnaval.
Toda essa introdução foi para demonstrar o fluxo do universo, cuja conexão com o tema me trouxe à 21ª Conferência de Ecovilas da Europa realizada na comunidade de Ängsbacka na Suécia. E adivinha quem organizou o evento? Uma brasileira da equipe de Terra Una! Adivinha quem eu encontrei de novo em plena Escandinávia? Sim, a Taisa Mattos!
Dez dos mais de 600 participantes da conferência eram brasileiros. Durante a cerimônia de abertura e encerramento, no momento de celebrar e honrar a Terra, a organizadora Mariana França representou todo o hemisfério sul em seu discurso na língua portuguesa e sotaque carioca. Era o Brasil marcando presença!
Ao ouvir suas primeiras palavras, fechei os olhos, coloquei a mão direita no peito em posição de honra à nossa nação e pulsei emocionada com mais de 207 milhões de corações brasileiros. Ainda em lágrimas, visualizei o meu sonho se concretizando: uma comunidade de aprendizagem para o desenvolvimento integral do ser, livre, gratuita e sustentável, co-criada através da cooperação.
[Pausa para três respirações profundas]
Tema da conferência: Solidariedade, Resiliência e Esperança, cujo objetivo é criar um mundo melhor baseado em ecovilas.
Compartilho abaixo algumas experiências vivendo em grande comunidade durante dez dias:
– O local bem estruturado, organizado e seguro (bem no estilo sueco), totalmente imerso na Natureza, me convidava a desfrutar a liberdade em sua plena essência.
– Voluntários de diversos continentes escolheram servir em áreas como cozinha, limpeza, organização e jardinagem. O meu desafio foi acordar diariamente às 05h40, com temperatura média de 8⁰, para compor a equipe do café da manhã servido às 08h. O mais nutritivo que já experimentei até hoje!
Na reunião de encerramento, cada grupo foi convidado ao centro para ser reconhecido com o típico banho de amor.
– A alimentação vegetariana, com opções veganas, era preparada e servida em área externa. Que delícia sentar na grama e saborear a comida, sob os raios do sol, com uma companhia de país diferente a cada refeição! Quantas conexões preciosas!
– As opções de networking e workshops eram tantas que, às vezes, eu só queria me isolar na floresta e sentir a energia do lugar. Fiz isso algumas vezes.
– O compartilhamento das emoções e sentimentos diários, sempre com o mesmo grupo, era um exercício para a escuta atenta do que estava vivo no outro e em mim.
– Solidariedade na prática: choveu forte durante todo o primeiro dia de conferência. Entrou um pouco de água na minha barraca e molhou o lençol. Eu já não tinha conseguido dormir no dia anterior por causa do frio intenso, mesmo usando o meu pijama mais quente e o saco de dormir para temperatura -5⁰. Relatei o problema à coordenação e consegui imediatamente uma vaga nas acomodações coletivas. Felizmente, não foi preciso porque a chuva parou e consegui secar o lençol na lareira e um edredon extra para forrar o chão da barraca.
– Cooperação: na exposição de ecovilas, por exemplo, fiz contatos que já me renderam trabalhos voluntários na Dinamarca, Hungria, Suiça, Bulgária, Romênia, Alemanha, Itália, Noruega, Estônia, Rússia e Irlanda. Todos confirmados!
Os pontos a seguir me incomodaram um pouco e ainda estou trabalhando todos internamente:
- Falta de consciência de alguns participantes com as regras de convivência, impactando diretamente no espírito de equipe e comunidade.
- Existência de determinados protocolos, hierarquias e egos inflados.
- Distorção do verdadeiro significado de amor livre.
Meu maior aprendizado nesta experiência:
Para viver em comunidade, eu preciso primeiro aprender a conviver comigo mesma. Por que esses pontos me incomodaram? O que está vivo em mim que provocou a identificação desses comportamentos no outro?
Não fomos preparados para lidar com os conflitos (especialmente os internos). O conflito é humano e é preciso muita prática para promover uma mudança cultural, que leva tempo para acontecer. O desafio das ecovilas é estimular essa prática constante.
Confira alguns momentos especiais neste vídeo compartilhado na página oficial do GEN-Europe.
A próxima será na Estônia, em julho de 2018.